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UM POUCO DE BÍBLIA: Por que Jesus mandou dar o outro lado do rosto quando alguém nos agride?

Ao pedir para “dar o outro lado do rosto a tapa” Jesus ensina que não devemos fazer justiça com as próprias mãos, rebaixando-nos ao nível do agressor, o que apenas perpetua a espiral da violência.

20/04/2021

No sermão da montanha, encontramos uma exigência de Jesus, considerada muito difícil de praticar: “Tendes ouvido o que foi dito: Olho por olho, dente por dente. Eu, porém, vos digo: não resistais ao malvado. Pelo contrário, se alguém te dá uma bofetada na face direita, oferece-lhe também a esquerda” (Mt 5,38-39).

À primeira vista, a palavra do Senhor parece exigir uma atitude de sujeição frente ao homem malvado, consentindo com as injúrias sofridas. Contudo, antes de qualquer coisa, precisamos entender a noção de direito em vigor naquele momento histórico, para contextualizar devidamente o ensinamento de Jesus.

A lei de Moisés mandava que o dano causado ao próximo fosse reparado pela imposição de semelhante prejuízo ao delinquente. Essa é a famosa Lei do Talião, que assim se formulava: “Darás vida por vida, olho por olho, dente por dente, mão por mão, pé por pé, queimadura por queimadura, ferimento por ferimento, contusão por contusão” (Ex 21,23-25; Lv 24,17-21; Dt 19 – 21; Ex 21,12-14).

Ao propor a reparação de uma ofensa com um desagravo equivalente ao agravo, a legislação de Israel propunha instaurar a justiça, pois geralmente o homem rude exagerava na violência, a única maneira de reparação de um crime. Em muitos casos, diante de um agravo, chegava-se a declarar vingança a todo parentesco de um inimigo, de modo desproporcional. A noção da retribuição proporcional, na aplicação da justiça, está presente no Código de Hamurabi, da Babilônia (1700 a.C.), o qual inspirou a Lei de Talião em Israel. Leis semelhantes encontramos na Legislação de Sólon, na Grécia e no Direito Romano, entre outras legislações antigas.

Embora a Lei de Talião visasse a redução da violência, ao propor uma reparação proporcional ao agravo sofrido, na prática do cotidiano, favorecia-a. O homem ofendido, ao reparar um agravo, a qualquer momento poderia sofrer vingança do outro, e assim, sucessivamente. De vingança em vingança, se intensificava a espiral de violência.

Destoando do ensinamento dos mestres da lei, Jesus propôs a superação da violência pedindo aos seus discípulos que não revidassem o agressor, como sugeria a Lei de Talião. Daí a sugestão de “dar o outro lado do rosto para o inimigo bater”. Com isso o Senhor estava propondo que a condição para frear o ciclo de violência só é possível quando somos capazes de perdoar, não revidando ao homem mau com vingança.

Todavia, não devemos deduzir que Jesus mandou seus discípulos se rebaixarem com intuito de dar margem para o homem violento perpetuar seu comportamento. Basta ter presente o seu questionamento aos algozes, que o crucificaram: “A essas palavras, um dos guardas presentes deu uma bofetada em Jesus, dizendo: ‘É assim que respondes o sumo sacerdote?’. Replicou-lhe Jesus: ‘Se falei mal, prova-o, mas se falei bem, por que me bates?’” (Jo 18, 22-23).

Ao pedir para “dar o outro lado do rosto a tapa” Jesus ensina que não devemos fazer justiça com as próprias mãos, rebaixando-nos ao nível do agressor, o que apenas perpetua o círculo vicioso da violência. No entanto, seu ensinamento em nada impede que a pessoa que teve sua honra lesada procure os mecanismos legais da sociedade para aplicação da justiça.

Padre Gilson José Dembinski

Parapsicólogo, pós-graduado em Bíblia e Ensino Religioso Escolar

 

 

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